Diogo Martins, especialista nacional em acessibilidade do AccessibleEU
Neste Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, devemos deixar as intenções e avançar para a prática de activamente incluir as pessoas numa sociedade que só funciona se for diversa e aberta.
Hoje é o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência. Este grupo social é o mais excluído da sociedade, o que acontece por diversas questões, maioritariamente sociais. Mas acontece também devido a uma gigantesca ausência de condições de acessibilidade e de contacto com as pessoas com deficiência, faltando identificar as nossas necessidades, de forma a trabalhar o espaço público para que este possa ser acessível para as pessoas com deficiência. O Metro Transportes do Sul (MTS) é um dos casos de inacessibilidade invisível. A inacessibilidade é invisível quando a sociedade entende que existe acessibilidade, mas factualmente não existe.
O MTS é um sistema de transportes, com elétricos, baseado num modelo de rede criado em França no fim da década de 1980, e implementado ao longo dos anos 1990. Estrasburgo foi uma das cidades a implementar uma rede em tudo semelhante à de Almada, na qual esta se inspira.
A rede de elétricos de Estrasburgo introduziu diversas características que mudaram radicalmente o conceito de rede de elétricos, para sempre. A sinalização própria, via completamente segregada, elétricos com piso 100% baixo e plano, estações em vez de paragens no meio das ruas, máquinas para vender bilhetes, informação sobre os tempos de espera, entre muitas outras. Uma das características mais relevantes e revolucionárias foi o facto de toda a rede, e respectivos elétricos, ser completamente acessível.
A acessibilidade, em Estrasburgo, tornou-se um eixo central no planeamento e desenho urbano. A rede de eléctricos, com os seus famosos Eurotram e todos os sucessores, oferece um nível de acessibilidade que passou a ser o standard em todo o mundo, tal foi o patamar de qualidade que foi estabelecido. O MTS copiou muita coisa de Estrasburgo, mas não a acessibilidade.
Os elétricos do MTS têm lugar no interior para pessoas em cadeira de rodas, mas na realidade não têm condições de acesso a todas as pessoas em cadeira de rodas. A altura entre as plataformas das estações e os elétricos é bastante superior ao que é recomendável para uma rede deste tipo, sendo que é possível não haver desnível entre ambos, como acontece em Estrasburgo desde 1994. Até mesmo a variação de altura entre as várias estações é interessante de analisar, ao não encontrarmos uma coerência nesta variação.
Aquando da inauguração da estação terminal de Cacilhas, foi prometido que o problema seria analisado e resolvido. Passados 15 anos, o problema não foi resolvido. A rede do MTS continua a ser inacessível a muitas pessoas, aumentando a dificuldade que se sente noutras infraestruturas e transportes da cidade, como as ruas inacessíveis, carros estacionados em cima dos passeios e autocarros que até recentemente eram inacessíveis porque a empresa não queria comprar veículos novos.
O Metro do Porto, que também é baseado na rede de elétricos de Estrasburgo, e também é uma rede de elétricos, tem vindo a piorar as suas condições de acessibilidade. Os primeiros elétricos, os Eurotram (versão na sequência dos de Estrasburgo) são completamente acessíveis e ao nível das plataformas das estações, mas os dois modelos comprados a seguir já não estão ao nível, apesar de ainda se conseguirem usar. O MTS, não tendo elétricos novos, mantém um problema estrutural de origem, possível de resolver.
Almada tem uma importância estratégica na Área Metropolitana de Lisboa que só pode ser alcançada com a garantia da acessibilidade a todas as pessoas, incluindo as pessoas com deficiência, que frequentemente são esquecidas e consideradas menos importantes que as restantes. A acessibilidade do MTS torna-se fulcral para garantir que se atinge esta importância estratégica, sendo que não é nada que nunca tenha sido feito anteriormente, nem é nada impossível de resolver correntemente.
Neste Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, devemos deixar as intenções e avançar para a prática de activamente incluir as pessoas numa sociedade que só funciona se for diversa e aberta.
Fotos: Bruno Marreiros
https://almadense.sapo.pt/opiniao/almada-a-cidade-dos-15-minutos/