Segunda-feira, Dezembro 11, 2023
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Nesta secundária de Almada, os livros juntam-se ao jornal escolar

Todas as semanas, a biblioteca itinerante “Aletria” vai à Escola Secundária Emídio Navarro, em Almada, para desenvolver e promover com um grupo de jovens aspirantes a jornalistas, o jornal escolar “Mar da Palha”, que já conta com mais de 20 anos.

 

Às 11h45 entra uma carrinha azul-marinho pelos portões de baixo da Escola Secundária Emídio Navarro, em Almada. É estacionada ao pé do refeitório e João Tempera e Luís Polido começam a montar o ambiente para a sessão de orientação com os jovens aspirantes a jornalistas do jornal escolar “Mar da Palha”. Esta é a Aletria, a “biblioteca móvel numa carrinha que partilha gratuitamente livros com a comunidade”, conta João. Está um dia de sol, agradável, com uma temperatura amena, onde se sente a brisa de fresco, algo que sabe bem para toda a preparação que vem de seguida.

A coordenação feita com os jovens segue até às 14h, havendo duas sessões. João Tempera e Luís Polido começam a abrir a carrinha e a montar na rua ao lado quatro mesas de madeira com pernas de metal e a colocar cadeiras ao seu redor. Dentro do veículo, João vai colocando os livros nas estantes, quadros nas paredes e luzes em forma de bola, que se penduram na porta deslizante do mesmo.

Enquanto decorrem os preparativos, uma auxiliar da escola vem entregar a última edição, publicada no projeto anterior, do jornal “Mar da Palha” para se vender, colocando-a em cima de uma das mesas onde irá acontecer, dentro de breves momentos, a primeira reunião.

Quem olha para a entrada do refeitório lê a mensagem no letreiro de ardósia “Aletria, biblioteca Itinerante. Proibida a entrada a quem não andar espantado de existir”. Toda forrada a madeira por dentro, a carrinha é revestida a livros, com um banco de madeira ao fundo, coberto com um material preto estofado e com diversas almofadas para criar um ambiente aconchegante. 

Coordenação com os alunos

 

Às 12h15 chega a primeira jovem integrante da equipa de redação do jornal “Mar da Palha”. Senta-se à mesa com João Tempera e começam a discutir qual o próximo artigo que irá escrever. Diz que lhe interessa escrever sobre o objeto de maquilhagem: eyeliner e a sua história. A conversa começa a desenrolar-se na tentativa de encontrar a melhor abordagem para o tema, para que se distinga de outros artigos semelhantes, dando ideias mais divertidas, como fazer perguntas absurdas ao Google — “Já alguém morreu por colocar eyeliner?” — para ver as respostas e criar temas mais apelativos. 

A segunda sessão de orientações começa com um grupo de 11 jovens, que pertencem ao 10º, 11º e 12º ano das diversas áreas escolares. Neste grupo encontram-se os gestores do podcast, membros da equipa de redação, responsáveis pela criação das redes sociais do jornal e designers do blogue. Alguns dos jovens vão buscar os almoços ao refeitório e sentam-se à volta das mesas a comer, enquanto se começa a discutir ideias para os próximos artigos. O barulho dos matraquilhos e das conversas altas por trás das mesas onde este grupo se encontra, provocam pausas na conversa.

É evidente a animação que os jovens retiram desta colaboração da “Aletria” com a Escola Secundária Emídio Navarro e o Plano Nacional de Leitura. Trata-se de uma parceria que “visa desenvolver e dinamizar o “Mar da Palha”, um jornal escolar que conta 21 anos de existência, dando voz aos jovens e aos problemas que os inquietam”, explica João Tempera.

Inicialmente coordenado pelo professor Luís Maia, o jornal contou com a participação de vários grupos de estudantes, tendo vencido o 1º lugar do concurso de jornais escolares, em 2022. Atualmente, este projeto escolar é coordenado pela “Aletria” e por dois professores bibliotecários: Sara Cacela e Pedro Campos. Tem também Vera Moutinho (jornalista) e Vasco Teodoro (músico e engenheiro de som) como consultores. O objetivo é dar continuidade ao trabalho feito anteriormente, considerando os interesses temáticos e estéticas dos estudantes envolvidos. “São eles que decidem tudo”, diz João Tempera.

Vários temas são discutidos ao longo da conversa. A definição do objetivo do jornal é um deles. Para a gestora do podcast, Alice Antão, do 11º ano de Ciências e Tecnologias, o objetivo do “Mar da Palha” é “ter pelo menos um tema que chame qualquer tipo de pessoa, para ser um jornal interativo”, de forma a que “todas as pessoas possam ter a vontade de o ler e também de ter mais acesso ao tipo de arte”.

Bernardo Santos, aluno do 10º ano de Artes Visuais, está animado com a parceria entre a Escola e a “Aletria”, que vai permitir a “partilha de trabalhos, projetos, exposições e eventos, que provavelmente não seriam reconhecidos sem este jornal”. O texto que irá escrever já está a ser discutido entre os colegas e os orientadores. O “Mar da Palha” terá seis edições até 2025, sendo a primeira no final de maio de 2023. Por este motivo, os temas dos artigos são escolhidos de forma a não estarem desatualizados na altura da publicação.

Para além dos temas a publicar, foi discutida a criação do blogue do jornal e como seria a abertura do podcast, que esperam lançar no final de abril com o objetivo de discutir temas que envolvam tanto cultura como filosofia, de forma a levar o público a refletir, imaginar e a passar um bom momento. Um outro assunto com bastante discussão foi a criação das redes sociais do “Mar da Palha”. Apesar de só duas jovens ficarem responsáveis por esta criação, todos deram ideias sobre aquilo que se poderia fazer para atrair seguidores e leitores. 

A troca de ideias e opiniões continuou, entre risos e seriedade. As horas e os minutos foram passando sem ninguém dar conta disso. O apoio é dado não só entre colegas, mas também entre orientadores e alunos. O interesse, a ajuda, o incentivo e a amizade que está a ser ali criada é palpável e sentida por todos. Os estudantes dão a sua opinião sem qualquer receio de ser rejeitada, demonstrando a liberdade que lhes é dada para serem criativos. 

 

Biblioteca itinerante e jornal “Mar da Palha”

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Criado por João Tempera, ao qual se juntaram posteriormente Luís Polido e Susana Pires, o projeto “Aletria” nasceu através de uma parceria com a associação Casa Invisível e com apoio da Câmara Municipal de Almada, com o objetivo de proporcionar aos visitantes experiências de convívio, discussão e conhecimento que promovam a cidadania e o bem-estar. Aos olhos dos alunos, esta biblioteca é interessante e inovadora. Tomás Coelho, aluno do 11º ano de Ciências e Tecnologias, ajudante no jornal “Mar de Palha”, acredita que o facto da “Aletria” ser em forma de carrinha, “torna todo o conceito de biblioteca muito mais divertido e dinâmico”. Para o jovem, “as pessoas têm curiosidade de ver o que é que está lá dentro”, aponta.

Aluna de 10º ano de Artes Visuais, Ana Oliveira, considera que a colaboração entre a “Aletria” e o jornal “Mar da Palha” dá voz aos estudantes, algo que julga ser importante porque “muitas vezes os jovens sentem que os adultos não os ouvem”, sentimento que é comum aos elementos que fazem parte do projeto. Os estudantes estão empenhados em divulgar o projeto “Mar da Palha” pelas ruas de Almada, tendo como motivação o desenvolvimento do projeto “Aletria”.

Depois de mais de uma hora de conversa, João Tempera olha para o relógio e vê que são 14h40, quarenta minutos depois da hora prevista para o final da sessão. As mesas, as cadeiras, o letreiro, as luzes penduradas na carrinha e os quadros começam a ser arrumados novamente e aquele ambiente divertido começa a ficar mais calmo. Os alunos começam a ir-se embora as poucos. Despedem-se uns dos outros, com o compromisso de começarem a trabalhar nos diversos temas que foram abordados nesta longa reunião. Na próxima semana haverá mais diversão.

 

Fotos: Beatriz Castelo

Conteúdo desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Escrita Jornalística”, da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa.

 

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