Inês Sarti Pascoal, especialista em urbanismo sustentável e ordenamento do território
Neste dia mundial das cidades, urge debater e planear cidades inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis. Almada tem potencial para ser uma “Cidade dos 15 Minutos”, pela imensa diversidade de serviços que possui. Seria necessário que as políticas de mobilidade, urbanismo, habitação e economia fossem planeadas e articuladas nesse sentido, com uma mesma visão de sustentabilidade urbana.
Não sendo recente, o conceito de “Cidade dos 15 Minutos” foi muito divulgado em 2016, por proposta do urbanista Carlos Moreno, tendo-se seguido a adopção política em Paris e a autarca Anne Hidalgo ganho as eleições em 2020 propondo esta visão para a cidade. Este modelo de planeamento defende uma maior proximidade e interacção social, surgindo do “crono-urbanismo” que prioriza a relação entre tempo e espaço para promover qualidade de vida. Esta configuração urbana permitiria às pessoas ter acesso aos serviços básicos em distâncias a 15 minutos a pé ou de bicicleta, dotando os bairros com parques, praças e espaços públicos, podendo levar a um impulso económico, fomentando a coesão social e criação de ecossistemas urbanos saudáveis.
Em Portugal existem cidades com potencial para serem “Cidades dos 15 Minutos”, e atrevo-me a nomear Almada. No entanto, Almada teria de criar e melhorar as infraestruturas para mobilidade suave. Através da ferramenta digital Dutch Cycling Lifestyle, podemos imaginar ruas mais saudáveis no coração de Almada.

Em Almada temos muitos dos serviços de que precisamos para viver: creches, escolas, lares e centros de dia, serviços de saúde, comércio variado, mercados, restauração, espaços culturais, como a Casa da Cerca ou o Fórum Romeu Correia, parques verdes, como o Parque Urbano Comandante Júlio Ferraz ou o Jardim do Rio. De que estamos à espera para melhorar as infraestruturas para mobilidade suave, que façam a ligação entre estes elementos urbanos?
O planeamento da mobilidade poderia ter o foco nas deslocações de proximidade, a pé e de bicicleta, e em transportes públicos para maiores distâncias, de modo a que seja confortável e eficiente não possuir um automóvel. Garantir que todas as ruas são acessíveis para uma pessoa que se desloque em cadeira de rodas, com um carrinho de bebé, de bengala ou andarilho. Promover a acalmia de tráfego rodoviário, para que possamos ter ruas seguras para quem anda a pé, incluindo crianças a ir para a escola. Criar uma rede ciclável contínua, que faça a ligação do centro de Almada aos interfaces de transportes, às restantes freguesias e aos concelhos de Lisboa e Seixal. Apostar no aumento da qualidade e frequência dos transportes públicos, recuperando a confiança neste serviço, perdido após tantas supressões.
Em Almada temos muitos dos serviços de que precisamos para viver: creches, escolas, lares, serviços de saúde, comércio, restauração, espaços culturais e parques verdes. De que estamos à espera para melhorar as infraestruturas de mobilidade suave que façam a ligação entre estes elementos?
Para além do trabalho a nível da mobilidade sustentável, seria necessário aumentar a habitação disponível, preferencialmente acessível, junto às infraestruturas urbanas já existentes. Aumentar as oportunidades de emprego, como a criação de espaços de cowork, de apoio a startups ou inovação, de modo a reduzir as deslocações para fora da cidade.
Quais os pressupostos para que uma “Cidade dos 15 Minutos” funcione e as pessoas não dependam de um carro para fazer as suas deslocações quotidianas?
A “Cidades dos 15 Minutos”: um modelo de planeamento urbano
Nas “Cidades dos 15 Minutos” pretende-se garantir as seis funções sociais urbanas essenciais —viver, trabalhar, estudar, comércio/serviços, saúde e lazer. Para tal, é necessário ajustar os parâmetros densidade, proximidade, diversidade e digitalização. A proximidade, temporal e espacial, pretende garantir que em 15 minutos, a população pode aceder a serviços básicos em tempo reduzido, reduzindo os impactos ambientais e económicos da mobilidade.
A diversidade em bairros de uso misto, com habitação, comércio e serviços, sustenta ruas economicamente activas, promovendo a habitabilidade e mantendo o seu custo. A participação e interacção da comunidade resulta numa diversidade cultural de pessoas e capital social. Esta dimensão multicultural tem implicações positivas no aspecto económico, já que os habitantes locais também desfrutam de uma variedade de produtos, levando a novas oportunidades de emprego.
A densidade tem ligação directa com viagens e diversidade. Considerando o número ideal de pessoas que uma área pode sustentar, pode-se planear a acessibilidade ao nível de serviços e consumo de recursos, sem a necessidade de recorrer a deslocações de carro.
Já a digitalização, permite ter serviços como compras online, transações sem dinheiro ou mesmo partilha de velocípedes, promovendo a inclusão, participação da população e entrega de serviços em tempo real. O teletrabalho e as comunicações virtuais têm também impactos positivos na redução de deslocações pendulares na cidade.
O Dia Mundial das Cidades, que se assinala esta terça-feira, 31 de Outubro, surge como mote para debater a sustentabilidade urbana e a “Cidade dos 15 Minutos” é um dos modelos de desenvolvimento urbano sustentável que podemos adoptar no planeamento das nossas cidades. A maioria da população vive em meios urbanos e as cidades contribuem, tanto para os problemas ambientais, como para a solução climática, se forem planeadas de acordo com critérios de preservação do ambiente.