Diana Tavares, jornalista e mestre em Comunicação de Ciência
Almada tem feito algum trabalho para sensibilizar os munícipes sobre a temática do lixo. Mas sejamos honestos connosco próprios. O Natal é um ponto fraco nos hábitos dos portugueses, também neste aspeto.
A quadra natalícia ocupa, em conjunto com o Ano Novo, duas semanas de um apelo ao consumo. Queremos dar presentes aos nossos pais, filhos, irmãos, avós e amigos. Para lá do objeto que ficará connosco, vão entrar nos nossos espaços urbanos um maior fluxo de caixas, papéis de embrulho, sacos, laços, plásticos protetores, vidros, papéis, e todos os outros materiais desenhados para a imagem e proteção de um novo produto. À mesa, o fenómeno repete-se nas caixas e embalagens para a comida.
Durante o ano de 2022, Almada deu alguns sinais de reconhecer o lixo como um problema a que se deve prestar atenção, com iniciativas como “Limpar Almada”, que se foca no voluntariado, uma estratégia vencedora, a recolha de eletrodomésticos porta-a-porta, que ajuda o cidadão em questões de conforto, ou o apoio e boa publicidade dada à exposição “Living Among What’s Left Behind”. Três apoios e iniciativas que não só apelam a que os cidadãos conheçam o problema, vejam os resultados do consumismo e que incluem um apelo à participação cívica na procura de soluções, de forma indireta, sem paternalismos.
Mas da mesma forma que o Natal, durante a pandemia, mexeu com muitas sensibilidades pela dificuldade dos portugueses em não cumprirem com a tradição da reunião familiar, também na questão do lixo vai ser muito complicado convencer as pessoas a não comprar, a não embrulhar, a não consumir. Isto vai gerar mais lixo, com embalagens grandes, que se as carrinhas da Câmara não recolherem a tempo, entrarão nos nossos ecossistemas pelas chuvas, pelas quedas nas nossas sargetas, pela Natureza circundante a absorver os materiais para o solo.
Olhando para os dados recentes sobre a reciclagem em Portugal, enquanto que a APA conclui que a taxa de preparação para reutilização e reciclagem foi “efetivamente” de 32%/33%, enquanto que a associação ambientalista Zero, contestando estes números, diz que a reciclagem no país se encontra nos 21%. Em nenhum dos cenários chegamos sequer aos 50%. Isto é preocupante.
Nas conversas de rua que tenho, por vezes, oportunidade de ter com outras pessoas sobre o tópico, nota-se igualmente duas coisas, a confusão, falta de informação e cansaço sobre o que se pode ou não reciclar em cada ecoponto, assim como uma crescente desconfiança sobre até que ponto os produtos são de facto reciclados, quer pela mini teoria da conspiração de que “vai tudo para o mesmo camião”, quer pelo facto de “só pode ser reciclado uma vez, depois já não dá”.
Perante todos estes fatores, como podemos tornar o nosso Natal mais amigo do ambiente? E que papel podem ter as autarquias em disponibilizar materiais, organizar métodos e coordenar estratégias entre as entidades públicas, organizações não-governamentais e empresas privadas? E até que ponto podemos sensibilizar a população, que apesar de demonstrar alguma preocupação com o ambiente, as alterações climáticas e o lixo nas áreas urbanas, já demonstrou ter na quadra natalícia um ponto fraco?
Um pouco por todo o mundo, várias estratégias são tentadas. Às vezes opta-se pela proibição a nível nacional, para não permitir a entrada do plástico no quadro urbano, como já aconteceu no Canadá, em Cabo Verde ou na Índia. Portugal, na questão dos sacos, optou por aumentar taxas e uma boa campanha para o uso de sacos reutilizáveis. Mas de novo, não foram estratégias especificamente pensadas para combater os apelos consumistas do Natal.
Qual será a estratégia correta para este problema específico? Temo que não teremos qualquer resposta ou análise antes do dia de Reis.