Valter Ferreira, perito europeu em inovação urbana e vogal Grupo Local da Iniciativa Liberal – Almada
Almada falha em criar as condições necessárias para se afirmar como um hub económico. A falta de estímulos para a fixação de empresas e a ausência de hubs tecnológicos afastam o investimento privado.
Almada, conhecida pelo seu passado industrial, pela proximidade à capital, pelas suas universidades e pela força das suas gentes, poderia ter-se tornado um exemplo de inovação e desenvolvimento urbano. Contudo, sob a governação socialista, Almada transformou-se num símbolo de oportunidades perdidas, presa à ineficácia administrativa e à falta de uma visão de futuro. Ao invés de potenciar o seu enorme capital humano e os seus recursos, o concelho está a perder o comboio da inovação e da competitividade.
O Innovation District, anunciado como uma das grandes bandeiras de inovação da Margem Sul, continua num impasse sem fim à vista. Este projeto, que poderia trazer empresas de alta tecnologia, startups e investigadores internacionais para a região, está parado. Como em tantos outros projetos promissores, o governo local falhou em implementá-lo, preferindo soluções de curto prazo que não resolvem os problemas estruturais da cidade. Outro exemplo, o Instituto de Artes e Tecnologia (IAT), um projeto que deveria estar a funcionar como um centro de excelência na área criativa e tecnológica, mas o atraso crónico na sua implementação é mais uma prova da falta de visão do executivo local. Cidades como Málaga ou Eindhoven, que apostaram fortemente em hubs de inovação tecnológica, colhem hoje os frutos dessas escolhas; Almada, no entanto, está a perder a oportunidade de se tornar num polo de referência.
A gestão ambiental é uma das áreas onde Almada mais claramente falha. A cidade está longe de implementar qualquer solução que se assemelhe a um ambiente inteligente, como é o caso de cidades que monitorizam em tempo real a qualidade do ar, o consumo de água ou a produção de resíduos. Cidades inteligentes, como Copenhaga ou Amsterdão, utilizam sensores para gerir eficazmente os seus sistemas de resíduos, mas em Almada até a simples coleta de lixo é ineficiente e inconsistente. A falta de soluções tecnológicas nesta área resulta em bairros sujos e numa sensação de desleixo.
Mais preocupante ainda é a gestão desastrosa da Arriba Fóssil da Costa da Caparica, um monumento natural de grande valor geológico que continua a ser ameaçado pela erosão e pela falta de proteção adequada. O potencial para criar programas educativos e ecoturísticos na arriba, como acontece em locais de importância natural noutras cidades europeias, continua por explorar. Almada poderia ter aqui um exemplo de gestão ambiental inteligente, mas a apatia do executivo socialista condena a cidade à degradação do seu património natural.
Outro pilar de uma smart city é a mobilidade, e aqui Almada é, mais uma vez, um exemplo de como não fazer. O caos diário nos acessos à Ponte 25 de Abril é um reflexo claro da falta de planeamento estratégico. Milhares de almadenses perdem horas no trânsito, devido à ausência de soluções de mobilidade eficiente e sustentável. A aposta na bicicleta, na mobilidade elétrica ou em transportes públicos mais rápidos e acessíveis continua a ser ignorada.
As praias da Costa da Caparica, um dos grandes atrativos naturais da região, são um exemplo claro da má gestão da mobilidade. Durante os meses de verão, a falta de organização e de alternativas viáveis de transporte torna o acesso às praias caótico, com quilómetros de filas e ausência de soluções de estacionamento adequadas. Cidades como Pozuelo de Alarcón, nos arredores de Madrid, estão a apostar em transportes intermodais e em mobilidade partilhada, algo que Almada poderia facilmente implementar, mas a falta de iniciativa deixa a cidade no caos.
A governança inteligente implica rapidez, eficiência e proximidade entre a administração pública e os cidadãos. Almada, no entanto, continua a ser uma cidade presa na burocracia. Um exemplo claro é o atraso sistemático dos processos urbanísticos, que podem demorar anos a ser aprovados. O projeto de reabilitação da Zona Ribeirinha de Cacilhas é um caso paradigmático: uma área com potencial turístico e comercial está há anos à espera de ser revitalizada, mas a morosidade dos processos urbanísticos impede o progresso. Enquanto isso, os empresários e investidores perdem o interesse e o território permanece subaproveitado.
Os serviços públicos, que poderiam ser digitalizados e otimizados com o uso de tecnologia, são lentos e ineficazes. A participação dos cidadãos em processos de consulta pública é praticamente inexistente, porque o executivo local não criou os canais digitais apropriados para facilitar a interação e a transparência. Cidades como Tallinn, na Estónia, são exemplos de sucesso na digitalização dos serviços públicos, onde os processos urbanísticos e administrativos são simplificados e acessíveis online. Em Almada, a inércia é a regra.
As infraestruturas de uma cidade inteligente devem ser bem cuidadas, conectadas e preparadas para o futuro. Em Almada, a degradação do espaço público é visível, com praças, jardins e equipamentos a cair aos pedaços. O uso da tecnologia para monitorizar e manter esses espaços seria uma solução óbvia, mas o executivo socialista continua a ignorar essas opções. A ausência de uma rede LORA (Long Range) impede a implementação de soluções IoT, que poderiam, por exemplo, monitorizar o estado das infraestruturas, da iluminação pública ou da segurança. A conexão entre diferentes partes do território é outra falha evidente. A zona da Trafaria, por exemplo, permanece isolada, sem uma rede eficiente de transportes ou comunicação, dificultando o desenvolvimento económico e social daquela região.
A inclusão é um dos pilares de uma smart city, e a tecnologia deve ser utilizada para garantir que todos os cidadãos beneficiem do progresso. Em Almada, assistimos ao aumento da pobreza e da insegurança. Zonas como o Bairro do 2.º Torrão são exemplos claros de guetização, onde o governo local falha em criar políticas de inclusão social e económica. Enquanto cidades como Bilbau ou Turim apostam em hubs de inovação social, Almada permanece sem estratégias para combater a pobreza energética ou o digital divide, que afasta os mais vulneráveis das oportunidades trazidas pela digitalização.
Finalmente, Almada falha em criar as condições necessárias para se afirmar como um hub económico. A falta de estímulos para a fixação de empresas e a ausência de hubs tecnológicos afastam o investimento privado. O Parque Tecnológico da Mutela, anunciado como um centro de inovação, continua por desenvolver, e as oportunidades de criar uma economia vibrante e sustentável continuam a ser desperdiçadas. Cidades como Porto ou Braga têm atraído empresas tecnológicas e startups com incentivos fiscais e infraestruturas preparadas para o futuro. Em Almada, o clientelismo e a inércia impedem qualquer progresso significativo.
A visão liberal para Almada seria a de uma cidade dinâmica, onde o setor privado e o público colaborassem para criar oportunidades. Uma cidade com mobilidade eficiente, serviços públicos digitais e transparentes, um ambiente sustentável e inclusivo. Seria uma cidade onde o talento e a inovação são valorizados, onde o espaço público é cuidado e onde o empreendedorismo é incentivado. Uma cidade liberal colocaria a tecnologia ao serviço das pessoas, apostando na liberdade individual, na eficiência e no desenvolvimento económico. A Almada inteligente é possível, mas precisa de uma mudança de rumo.