Falha tectónica do sistema do Vale Inferior do Tejo já assistiu a vários abalos significativos ao longo dos séculos. “É sempre conveniente estar atento”, apesar da recente atividade sísimica na zona não ser motivo para alarme, explica a investigadora Paula Figueiredo.
Não passaram seis meses entre o sismo de agosto e o que esta semana se voltou a sentir em Almada e em outros concelhos nas duas margens do Rio Tejo. Para quem os sentiu poderá ser difícil não fazer comparações, mas Paula Figueiredo, especialista em paleosismologia e falhas ativas, explica ao ALMADENSE que as duas situações são muito diferentes.
Primeiro, a localização. O abalo mais recente aconteceu ao largo da costa da Fonte da Telha – a 14 quilómetros a oeste-sudoeste do Seixal, conforme os registos oficiais – e aquele registado em agosto foi na costa de Sines. “Foram em falhas diferentes”, diz Paula Figueiredo. Depois, a profundidade: sete quilómetros agora e 10,7 quilómetros há seis meses. O que ajuda a explicar porque é que este último se sentiu mais, apesar de ter uma menor magnitude (menos energia libertada) – 4,7 a 17 de fevereiro de 2025 e 5,3 a 26 de agosto de 2024.
“Não faz sentido comparar sismos ocorridos numa falha e em outra”, conclui a investigadora da Universidade Estadual da Carolina do Norte, que colabora também com o Instituto Dom Luiz da Universidade de Lisboa, em resposta por escrito ao ALMADENSE.
“Isto pode parecer contra senso, porque muitos de nós sentimos o sismo mais forte, abanões mais vigorosos e, em alguns casos, até ouvimos o som”, reconhece a especialista. “Mas esses efeitos resultam de ter sido um sismo localizado mais próximo e também de ter sido menos profundo, mais superficial. O de Sines foi maior, mas mais profundo; os efeitos fizeram-se sentir até distâncias maiores, mas em geral com menos intensidade na zona de Lisboa e na zona Trafaria – Fonte da Telha”, continua.
Certo é que “existem e são várias” as falhas tectónicas na região de Almada e que estas contribuem para aumentar o risco de atividade sísmica, confirma Paula Figueiredo. As principais falhas tectónicas na proximidade dos concelhos da Margem Sul estão ligadas ao sistema do Vale Inferior do Tejo, região que ao longo dos séculos já registou vários abalos dignos de nota.
“Já houve sismos importantes em 1344, 1531 ou 1909. No caso de 1531, estão descritos danos e ter sido sentido de forma intensa na Margem Sul”, explica a especialista. “Isso não quer dizer que não haja outras falhas mais pequenas, menos evidentes, e que de vez em quando também podem gerar sismos mais pequenos. Há muito trabalho feito e conhecemos muito, mas temos sempre surpresas”, explica.
O Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) confirma. Numa nota publicada esta semana, lembra um estudo de 1984 que identifica numerosas falhas perto do litoral da Fonte da Telha. Aqui, os movimentos da crosta terrestre tendem a comprimir as placas tectónicas umas contra as outras em duas grandes unidades – a “Cadeia da Arrábida” a sul, e o “Sinclinal de Albufeira”, a norte. “A hipótese mais consensual é que o sismo de 17 de fevereiro resultou de uma falha formada paralelamente à estrutura da Cadeia da Arrábida”, lê-se na nota. “Outras hipóteses relativas à origem deste sismo estão, contudo, em análise.”
Quanto às réplicas que se têm sentido nos últimos dias, Paula Figueiredo explica que o fenómeno é “normal” e poderá continuar durante mais alguns dias, com tendência para que os próximos abalos sejam cada vez mais fracos. Não obstante, acrescenta, “por vezes, pode ocorrer uma réplica mais forte ou, muito raramente, outro sismo maior”. Razão pela qual o ramo da sismologia é tantas vezes incerto e dado a surpresas. “Nunca se pode antecipar como vai ser. Por tudo isso, é sempre conveniente estar atento.”
Atualizado às 14h25 com informação disponibilizada pelo IPMA.
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