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Quinta do Almaraz: o reencontro com uma História de há três mil anos

Estação Arqueológica da Quinta do Almaraz reúne inúmeros vestígios da civilização do primeiro milénio A.C. Depois de quase 20 anos sem escavações arqueológicas, a Câmara Municipal de Almada quer realizá-las anualmente e devolver o sítio à população.

 

Em Almada Velha, junto do Castelo, a Quinta do Almaraz desvenda um dos mais vastos e melhor conservados povoados da Idade do Ferro (séculos VIII a III a.C..) de toda a fachada ocidental da Península Ibérica.

As estruturas habitacionais e defensivas deste povoado do primeiro milénio a.C., com génese marcada pela influência fenícia, foram descobertas em 1986, durante uma visita à Fábrica de Óleo de Peixe, em Cacilhas, conta Ana Olaio, arqueóloga e investigadora responsável pelo Projeto de Investigação em curso.

 

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“Os visitantes, entre quais se encontravam arqueólogos do Museu de Almada e do Centro de Arqueologia de Almada, repararam numa estrutura negativa, uma fossa, onde se verificava a presença de material arqueológico. Isso suscitou curiosidade e pediram ao proprietário para fazer aquilo a que chamamos “prospetar” —olhar para o chão e ver se são identificados mais indícios de uma possível ocupação”, descreve.

Perceberam que havia muito mais material. “Almaraz impressiona pela quantidade de material encontrado, sobretudo cerâmico. A loiça utilizada no quotidiano evidencia a dinâmica do povoado durante o período em que esteve ocupado. Existem ainda vários indícios da importância do comércio: materiais oriundos do Egito, da Grécia e do sul da Península Ibérica e pesos de balança utilizados para trocas comerciais”, conta a arqueóloga ao ALMADENSE.

O espaço começa a ser explorado logo em 1988, numa altura em que Almaraz era ainda uma propriedade privada, onde se previa a construção de uma urbanização que ocuparia a quase totalidade da zona arqueológica identificada. Em 2000, a Câmara Municipal de Almada (CMA) adquiriu o espaço para garantir a preservação.

 

quinta-arqueologia

Hoje, quem chega a Almaraz observa um terreno que se perde de vista, interrompido por pontuais hortas e pequenas arrecadações a céu aberto. Não se vê ninguém e os portões estão fechados. “As hortas estão concentradas numa área arqueológica não sensível. São cultivos para consumo próprio e os donos ajudam-nos a manter o espaço limpo e organizado”, explica Ana Olaio.

Com vista para algumas destas hortas, do lado esquerdo, na parede de um dos portões está uma placa, afixada em 2017, que apela a um “futuro para Almaraz”, assinada por mais de três dezenas de cientistas e aprovada pelo Fórum Almaraz.

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A arqueóloga explica que, de 2001 a 2019, não existiram escavações nem desenvolvimento significativo na investigação devido a questões resultantes de obrigações legais próprias da atividade arqueológica. Durante este período de inatividade, o local foi classificado como Sítio de Interesse Público, em 2013, na sequência de um pedido feito pela CMA ainda nos anos 90.

Ana Olaio avança que a intenção é ter campanhas arqueológicas anuais, reforçando que a “intenção é abrir ao público em permanência, ter um espaço visitável constantemente”.

Enquanto Almaraz não abre ao público, trabalha-se para aproximar o sítio da população através de outros meios de divulgação, como informação online, meios de comunicação, colóquios, exposições e visitas pontuais para escolas e público em geral.

 

Uma vasta herança arqueológica: 230 contentores de material para estudar

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A investigação em Almaraz demonstra que os fenícios estenderam a sua influência até à Foz do Tejo e dá-nos várias pistas sobre o quotidiano do povoado. Acredita-se que esta seria uma comunidade que se dedicaria à produção metalúrgica, produção oleira e comércio. A atividade agro-pastorícia e a atividade piscatória complementavam as primeiras e garantiam o sustento da comunidade que habitou este território há quase três mil anos.

A descoberta das cerâmicas também impressionou os investigadores —pela quantidade e diversidade. Por sua vez, os cadinhos de fundição insinuam também a prática de atividades metalúrgicas, parte central da economia de Almaraz.

Em relação à alimentação, os ossos de animais encontrados são indicativos de uma dieta essencialmente baseada em ovelha e cabra, entre outros . Os esqueletos de cães sugerem que estes eram animais de companhia, sobretudo nas caçadas e como cães-pastor.

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“Entre 2017 e 2019, estivemos essencialmente a regularizar o que estava para trás. Juntando as escavações recentes às anteriores, são cerca de 230 contentores só de artefactos que estamos neste momento a estudar. Nas reservas de arqueologia do Museu de Almada, Almaraz é a coleção que ocupa mais espaço. Recolhe-se mesmo muito material, é inacreditável”, conta Ana Olaio.

Em maio de 2020 regressaram as escavações, promovidas pelo Município de Almada, com uma equipa de investigação que envolve entidades como o Centro de Arqueologia da Faculdade de Letras-UNIARQ, a FCT e a NOVA FCSH, com tarefas divididas entre profissionais dos vários ramos da arqueologia e alunos.

 

arqueologia

Embora o período primeira metade do primeiro milénio a.C tenha sido o mais significativo em termos de vestígios arqueológicos, encontraram-se igualmente sinais de povoados do Calcolítico, Idade do Bronze e do Romano Republicano.

Para além de vários períodos identificados em Almaraz, existem outros locais arqueológicos relevantes espalhados pelo concelho, sendo que o povoado não se desenvolveu de forma isolada no território.

Pelo menos desde o século VI a.C. que existiram ocupações motivadas pela procura de áreas férteis e acesso ao rio, como demonstram os vestígios encontrados na Rua D. Manuel Febrero/Pedrada (Cova da Piedade) e no Monte de Caparica —na Quinta do Facho, na Figueira 1 e Quinta da Torre, estes últimos de uma ocupação curta e mais tardia, entre a passagem da Idade do Ferro e o período Romano.

São identificações já antigas, dos anos 70-80, por mero acaso ou no contexto de obras. A legislação para a arqueologia surge apenas nos anos 90, pelo que não existia uma base legal para obrigar à existência de acompanhamento ou campanhas de escavação prévias. Existe, no entanto algum material dos sítios que permitem caracterizá-los sumariamente.

Relativamente ao futuro das escavações em Almaraz, o passo seguinte é apurar em que momento exato surgiu o povoado e compreender o porquê do abandono do local. Na mesma época, enquanto Lisboa se desenvolve significativamente, Almaraz vai perdendo dinâmica. Por outro lado, pretende-se colocar amplas áreas da parte interna do povoado à vista, o que permitirá compreender a sua organização interna e o quotidiano da comunidade que ali habitou.

“É uma herança arqueológica de todos. Mas, em primeiro lugar, dos almadenses, que têm aqui um importantíssimo sítio arqueológico, dos mais bem conservados deste período na Península Ibérica”. Por isso, para além do objetivo prioritário de aprofundar a investigação, pretende-se “abrir ao público em permanência e garantir que a população almadense defende esta sua herança patrimonial, tornando-a, quem sabe, num marco identitário da cidade”, termina a arqueóloga.

 

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