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Escola Lá Fora: modelo que coloca as crianças em contacto com a natureza chegou a Almada

Criado em 2020 por duas profissionais que não se reviam no ensino tradicional, o modelo “forest school” funciona há dois anos em Almada. Crianças são encorajadas a ter confiança, iniciativa e liberdade de escolha. 

 

Enquanto desliza no “slide” improvisado, montado entre dois pontos da mata do Seminário de Almada, a pequena Vitória, de cinco anos, conta ao ALMADENSE em que consiste aquele espaço da sua escola ao ar livre: nesta “cozinha” há loiças e tachos para fazer comida de faz-de-conta, enquanto na cama de rede as crianças baloiçam à vez, tentando chegar o mais alto possível. Ao lado, há uma “piscina” improvisada ao ar livre para chapinharem. “Agora não tem água… o sol derreteu-a”, lamenta.

Vitória é uma das 24 crianças que frequenta a Escola Lá Fora em Almada, uma iniciativa que pretende introduzir um conceito educativo “diferente” e que está a crescer em Portugal. O conceito é baseado no modelo internacinal “forest school”: em vez de uma educação tradicional, dentro de quatro paredes, leva as crianças para o exterior, para o contacto com a natureza, numa lógica que privilegia a criatividade e a liberdade do aluno para desenvolver as suas próprias capacidades.

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A bicicleta é o meio de transporte mais usado na Escola. Bruno Marreiros / Almadense

O conceito remonta a meados do século XX e existe há décadas em países como a Suécia ou a Alemanha. Em Portugal, foi introduzido em 2020 por Ana Passos, psicóloga e Ana Galvão, educadora de infância, depois de terem trabalhado juntas numa IPSS em Lisboa, de onde saíram por não se reverem no modelo pedagógico aplicado. A primeira escola abriu na Quinta das Conchas, em Lisboa. Em 2023, o conceito estendeu-se a Almada, mais concretamente ao Seminário de São Paulo, e à Ericeira. No início do próximo ano letivo, está já certa a abertura de uma quarta escola no Estoril para crianças até aos 6 anos. Tem ainda atividades de verão e extracurriculares até aos 12 anos, e playgroups para crianças até aos 3, onde pais e filhos podem participar.

 

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A criança no centro da aprendizagem

O que salta desde logo à vista é a horizontalidade do modelo aplicado. “Não há níveis de aprendizagem, ela constrói-se na relação com os outros e com o espaço”, explica Ana Passos. As crianças são encorajadas a explorar, a criar as suas próprias atividades, nada lhes é proibido, e a intervenção dos adultos é mantida a um mínimo. “Se, por exemplo, eles quiserem subir uma árvore, nós não os vamos proibir, porque essa é uma atividade de descoberta. Podemos dizer-lhes para terem atenção a isto ou àquilo, a apoiarem bem as mãos, etc… mas o reforço é sempre pela positiva”.

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Crianças sobem à plataforma montada na árvore. Bruno Marreiros / Almadense

Na mata do Seminário, durante a visita do ALMADENSE, é esse o ambiente que se vive: algumas crianças circulam de bicicleta, enquanto outras brincam animadamente à volta de uma tenda improvisada e algumas escalam até à plataforma de madeira montada entre as árvores. Dois dos mais cansados partilham uma cama de rede, aproveitando para descansar à sombra.

O intuito, explicam as responsáveis pelo espaço, é reforçar a relação das crianças com o meio ambiente e com práticas sustentáveis, convidá-las a ter iniciativa e a desenvolver a curiosidade, e a descobrirem por elas próprias os seus limites. Por isso, também o próprio planeamento das atividades, as regras e limites do espaço envolve a sua participação direta, sem que nada lhes seja imposto contra a sua vontade. “As crianças estão no centro do processo de aprendizagem e têm livre escolha”, esclarece Ana Passos.

Excetuando casos extremos de mau tempo, o  na floresta é mantido mesmo em situações de chuva ou vento, também como forma de aprendizagem. “Aqui não temos de lhes explicar o outono, o outono acontece à volta delas”, diz Ana Galvão. Ocasionalmente, isso também quer dizer que se magoam no decorrer das brincadeiras — algo que, dizem as educadoras, “faz parte do processo”. Aliás, aqui as crianças magoam-se menos do que em contextos tradicionais, constatam as responsáveis, exatamente porque têm mais liberdade para arriscar e conhecer os seus próprios limites.

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Na Escola Lá Fora não há sala de aula, mas sim uma tenda. Bruno Marreiros / Almadense

Outro dos focos é o trabalho no seu desenvolvimento emocional. As manhãs geralmente começam com uma conversa entre crianças e adultos enquanto comem o pequeno-almoço, para preparar as atividades do dia e para cada um poder dizer como se está a sentir. A ideia é trabalhar a empatia e o espírito de entreajuda. As educadoras garantem que têm visto em primeira mão os resultados. “Lembro-me da primeira vez que ouvi um dos nossos meninos dizer: ‘não digas isso porque ela hoje está triste!’, conta Ana Galvão. “É sinal de que eles absorvem isto”, conclui.

 

Um modelo que não quer ser “elitista”

As fundadoras da Escola Lá Fora não têm dúvidas de que este modelo educativo que, à partida, pode parecer pouco ortodoxo, tem benefícios ao nível da saúde e do desenvolvimento cognitivo das crianças. Por que é que, então, demorou tantos anos a chegar a Portugal, país conhecido pelo sol e pelo bom tempo? “Acho que é mesmo uma questão cultural”, lamenta Ana Passos. “Há uma resistência incutida. Está muito enraizado que, para uma criança aprender, tem que estar na sala de aula. Para não falar das pressões sociais. Ninguém quer ser o pai que é apelidado de maluco por outros pais por meter o filho numa ‘escola de selvagens’”, como às vezes ouvimos.”

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Consideram também que a legislação em vigor se encontra desajustada, demasiado virada para o modelo tradicional e sem espaço para albergar modelos alternativos. Há vários anos que as gestoras da escola tentam obter junto do Ministério da Educação autorização para se constituírem como IPSS, o que permitiria, entre outras coisas, ter acesso a apoios da Segurança Social, de forma a que algumas crianças pudessem ver comparticipada a mensalidade, que ronda os 460 euros mensais — valor que serve sobretudo para pagar a renda ao Seminário e para os gastos com as educadoras, já que o modelo obriga a que haja um número maior de alunos por estudante do que na rotina tradicional.

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Escola instalou-se na mata do Seminário de São Paulo, em Almada. Bruno Marreiros / Almadense

“Sabemos que é um preço que nem todas as famílias conseguem suportar. O nosso interesse não é fazer disto uma coisa elitista”, garante Ana Passos. “Muito pelo contrário: queremos alargar isto ao máximo número de famílias, independentemente do escalão social em que se encontrem”, acrescenta.

Ao mesmo tempo, dizem sentir que há um reconhecimento cada vez maior de que modelos como a “forest school” vêm responder a algumas carências do método regular. Tanto que já várias escolas tradicionais (sobretudo privadas) fazem programas com a Escola Lá Fora, organizando dias ou períodos de aulas para que as crianças tenham contacto com a natureza.

Uma coisa, acrescentam, é certa: o feedback que recebem dos pais quando os alunos saem da Escola Lá Fora para começar o ciclo da primária é mais do que positivo. “Normalmente os pais ficam cheios de pena quando os meninos têm de fazer a transição (…) Costumam até dizer-nos que, quando chegam ao primeiro ano, começam a ficar doentes com constipações com muito mais frequência do que aqui.”

 

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