Único Monumento Nacional do concelho de Almada, o Forte de São Sebastião da Caparica encontra-se hoje em estado de ruína e aguarda restauração.
Na margem sul da região de Lisboa, oposta à Torre de Belém, encontram-se as ruínas da antiga Torre Velha, também conhecida como o Forte de São Sebastião da Caparica ou Fortaleza da Torre Velha, o único Monumento Nacional do município de Almada.
Construída entre 1385 e 1433, por ordem de D. João I, a torre era uma das principais defesas da entrada no Rio Tejo. “O seu desenho e construção foram ao âmbito de elaborar as primeiras estruturas de fortificação dos portos de Setúbal e Lisboa, no século XIV”, conta ao ALMADENSE Rui Mesquita Mendes, historiador especializado em arquitetura e território. Hoje, o monumento encontra-se em ruínas e “quase” ao abandono na zona de Porto Brandão, na margem sul do Tejo.
Construção e reconstruções
A Torre Velha de Caparica é um dos exemplos mais importantes de arquitetura militar renascentista de Portugal e o lugar fortificado mais antigo do concelho de Almada, depois do Castelo. Foi dos primeiros sistemas de artilharia a integrar a defesa do rio Tejo, juntamente com a Torre de Santo António de Cascais e a Torre de São Vicente de Belém.
A sua construção, desenvolvida a par com a Torre Nova de Belém, em Lisboa, tinha como objetivo criar linhas de fogo defensivas que se cruzassem entre as duas margens, impedindo a entrada de qualquer navegação inimiga. “Esteve envolvida em ações militares de relevo, como nas movimentações da Batalha de Alcântara em 1580, onde esteve do lado do Prior do Crato”, explicou o historiador.
Nos dias de hoje, mantêm-se apenas as partes fundamentais do edifício, como comprova a planta de 1692. A planta desenvolve-se em U, sendo composta por três corpos e baluartes com casernas. A base central da Torre Velha é quadrangular e rebaixada, onde estava presente a casa do governador.
Ao longo dos anos, o forte militar foi alvo de diversas manutenções. Durante o seu reinado, D. Sebastião ordenou a “fortificação e reconstrução da torre, já com o nome de Forte de São Sebastião, e concedeu a sua capitania a Lourenço Pires de Távora (1572) e ao seu filho, Cristóvão de Távora (1573), da conhecida família dos Távoras da Caparica”, conta Rui Mesquita Mendes.
A fortaleza foi outrora “local de passagem e alojamento do rei Dom Sebastião, quando vinha caçar nas charnecas e pinhais reais da Caparica, tendo aqui como grande conselheiro o seu capitão e governador, Lourenço Pires de Távora e depois os filhos deste, Cristóvão de Távora e Rui Lourenço de Távora, que também foi Vice-Rei da Índia”.
Além das funções como forte militar, a Torre Velha também serviu como prisão, foi “onde esteve injustamente preso D. Francisco Manuel de Melo, que escreveu a sua obra Carta de Guia de Casados em 1650 durante a sua pena”, contou o especialista.
O historiador conta que nos finais do século XVIII a Torre Velha recebeu obras, “conduzidas pelo engenheiro francês Francisco de Alincourt”. Depois disso, foi “ocupada pelo Lazareto originário da Trafaria em 1815, que ali funcionou até à construção dos novos edifícios a sul da Torre Velha em 1860, sendo depois transformado em Hospital de Isolamento”.
Monumento Nacional desde 2012
A 26 de abril de 2012, a Fortaleza da Torre Velha da Caparica foi classificada como Monumento Nacional, através de resolução do Conselho de Ministros, convertendo-se no único património no municipio de Almada a receber a distinção.
A sua classificação deve-se à importância e singularidade na História da arquitetura militar portuguesa, que representa um valor cultural de significado para a nação.
“O valor histórico, patrimonial e cultural do bem que ora se pretende ver classificado articula-se segundo critérios como a autenticidade, a originalidade, a raridade, a singularidade e a exemplaridade, que se revelam significativamente na relevância matricial, arquitetónica, histórica, simbólica que este adquiriu como lugar da memória histórica e patrimonial de Portugal”, pode ler-se no decreto que classificou a Fortaleza da Torre Velha como monumento nacional.
Segundo o historiador, a classificação da Torre Velha como Monumento Nacional é essencial para se conhecer, estudar e aprofundar, o que só é possível com a ”devida proteção legal”. Teve como propósito “favorecer o seu usufruto pela população, porquanto possuía e possui um elevado potencial do ponto de vista monumental e patrimonial, já que a área onde se localiza tende a tornar-se, cada vez mais, uma zona de valorização patrimonial”.
Com a sua proteção garantida, falta assegurar a valorização, restauração e dinamização. Para tal, torna-se essencial a realização de dois tipos de obras, acredita Rui Mesquita Mendes: “uma de consolidação estrutural e melhoria da segurança do espaço e outra de recuperação e preservação do edificado”.
Com o passar dos séculos, a degradação da fortaleza continua evidente, sendo um edifício que nunca foi objeto de prospecção arqueológica ou renovações modernas.
“No passado foram feitas algumas visitas pelos Amigos do Castelos, com a autorização do operador logístico situado à beira-rio, que permitia o acesso à mesma, mas as deficientes condições de segurança levaram-no a terminar com estas visitas. Atualmente é muito perigoso aceder ao seu interior, acesso muito limitado pois a serventia da Torre Velha está vedada ao público por estar circundada por espaços privados, apesar de ser Monumento Nacional”, recorda o historiador.
Programa Revive quer dar nova vida ao monumento
Em 2019 a Torre Velha foi incluída no programa “Revive”, um projeto do Estado Português, que prevê a abertura do património ao investimento privado para o desenvolvimento de projetos turísticos e reabilitações, assim como o Castelo de Almada.
“Se o Programa Revive permitisse, pelo menos, atalhar a sua degradação e criar as condições necessárias para a sua fruição pública, o que nos está neste momento vedada, já seria uma mais-valia”, aponta Rui Mesquita Mendes.
Uma mais-valia da restauração e exploração da Torre Velha no meio turístico é a sua ligação à Torre de Belém. “A relação entre as torres leva-nos a pensar que faria todo o sentido num projecto conjunto e que, certamente, contribuiria para uma maior valorização das duas margens”, remata o historiador.
Fotos: CD Centro de Arqueologia de Almada
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